15.5.07

Só no estilete

Centenas de milhares de brasileiros esmorecem pela árdua rotina de acordar antes do sol nascer para sair de casa todos os dias, para realizar trabalhos que às vezes beiram a total falta de bom senso. Condições de trabalho inimagináveis para os freqüentadores da classe média, tão habituados a criticar o enorme abismo existente entre a classe trabalhadora do Brasil e os seus representantes majoritariamente oficiais. Esquecem eles, ofuscados pelo brilho do holofote das grandes conquistas, que a imensa maioria das pessoas vive com muito menos do se pode aceitar – com base nos modernos valores difundidos diariamente pelo impacto do bombardeio midiático a que somos exponencialmente expostos – e com muito mais razões para não acreditar em mundo melhor e mais justo.(Charge do Henrique, fonte: www.morcego.blogger.com)

Pois bem, enquanto uns reclamam de barriga estufada - como o senhor ministro da defesa Waldir Pires que, em um ato de “justificada” indignação com os benefícios oferecidos pelo seu “árduo” trabalho, questionou a sabedoria e o bom senso crítico da população em um entrevista para algum programa da Grande Rede. Depois de pagar TODAS as suas (nada) humildes contas básicas do mês, lhe sobravam apenas CINCO MILREAIS.

Já ouvi algumas histórias reais, seja em mesa de bar ou de copo em copo, de famílias bem numerosas que vivem com muito pouco dinheiro. Quase nada, comparado aos meus e aos seus padrões. Quinhentos reais por mês podem sustentar mais de quatro neguinhos, branquinhos, brasileirinhos. O que define o entendimento da vida de cada um? Suas referências, o programa que o pai assiste todos os dias, as sagradas novelas que a mãe e tia vêem todos os dias, as notícias deste ou daquele jornal. Verdades enlatadas e distribuídas abarrotadas para uma sociedade que foi ensinada a fazer escolhas de consumo desde cedo.

O que este senhor ministro merece a mais que aquele cara que acorda todo dia às quatro da manhã pra pegar o ônibus às cinco, chegar no trabalho às seis, honrar o seu papel de pai de família até às seis da tarde, pegar um ônibus lotado, caminhar até o súper para fazer aquele ranchinho da noite e chegar em casa cheio de amor pra dar para a mulher, os filhos, a sogra e aquele cunhado pentelho que bebe tua ceva e pega tua camiseta emprestada depois de traçar a tua irmã para encarar o churrasco clássico de domingo com jogo do grêmio na TV. Sim, ele também curte a família, assim como tu, privilegiado que pode estar em frente a um computador acessando a Internet com uma velocidade bem menor do que aquela que tu queria, mas bem mais prático que 30 anos atrás, quando o teu pai tinha que mandar um telegrama cantado no dia dos namorados, já que não rolava fazer um vídeo no celular, editar no computador e botar no YouTube pra todo mundo ver.

Onde este senhor ministro, escolhido por uma corja de sem-vergonhas que já estamos todos carecas de ver em noticiários, gasta o seu SUADO dinheirinho, ninguém quer saber. A pergunta que não cala é POR QUE nem todo mundo recebe aumento no salário, ganha mais benefícios, regozija de grandes mordomias, por mínimas que sejam. POR QUÊ, enquanto toda a população convive com a miséria – vide a relação entre um cidadão voltando do trabalho pra casa em seu carro popular e um cidadão paria da sociedade fazendo malabares em uma esquina qualquer para esmolar alguns trocados em troca de uma performance típica do povo brasileiro, a de se VIRAR NOS TRINTA.

Parabéns, seu Waldir. Se o senhor começar a anotar seus gastos, vai ver que dá pra economizar mais um pouquinho. Apertando daqui e soltando bem pouquinho dali, caminha a humanidade. Pelo menos aqui em terra brasilis, onde se arrastam crianças pelo asfalto impunemente.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Depois de pagar TODAS as suas(nada) humildes contas básicas do mês, lhe sobravam apenas CINCO MILREAIS."

Sobrar??? O que é isso?